Profeta

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Fim do mundo?


As teorias apocalípticas relacionadas ao calendário maia atormentam muita gente. Céticos podem duvidar, mas tem quem esteja construindo casas fortificadasencomendando bunkersestocando comida e se mudando para lugares altos. Como não há indicação do quê promoverá o "fim do mundo", os mais assustados tendem a se precaver de catástrofes diversas. Aproveitando esse nicho, guias de sobrevivência na internet estão ganhando popularidade ao tratar de perigos como armas nucleares, ataques cibernéticos, terremotos devastadores e tsunamis gigantescos.
Nessa onda, sobrou até para os zumbis, tema da maioria dos manuais de sobrevivência encontrados na web. O criador do guia "10 coisas essenciais para sobreviver ao Apocalipse Zumbi: Um Guia Prático", John Hornor Jacobs, admite que um apocalipse zumbi não é nem remotamente possível. "Há um milhão de maneiras para que a raça humana seja extinta - poluição, guerra nuclear, guerra bioquímica, pragas em níveis de pandemia -, mas não zumbis. Zumbis, no entanto, seriam a maneira mais divertida para o mundo acabar", alega.
Além de prever o fim mais divertido - uma horda de mortos-vivos promovendo o caos no planeta -, os guias são válidos para outros tipos de catástrofe, segundo os autores. "Se você está preparado para o apocalipse zumbi, você está preparado para enfrentar qualquer desastre", afirma Kristan Nickels, do Conselho de Administração e Mídia do Esquadrão Zumbi (Zombie Squad).
Comida, comida, comida
Os guias de sobrevivência fornecem desde as dicas mais comuns, de obter e estocar água e comida, até as mais inusitadas, como não ir ao supermercado e usar um cinto para segurar as calças depois de perder peso. Para Nelson Aguilar, autor de três guias de sobrevivência - contra armas nucleares, ataque cibernético e, claro, zumbis-, a busca pela sobrevivência começa com a obtenção ou estoque de alimento, pois ele ficaria escasso rapidamente. O próximo passo seria encontrar abrigo e armas. "Não há vantagem em ter água e comida se você está congelando no meio selvagem. As armas seriam úteis para dissuadir qualquer perigo (animais ou pessoas)", esclarece.
Assim, Aguilar sugere que você vasculhe a sua garagem e busque por ferramentas e suprimentos. Ele garante que, em poucos minutos, você deve encontrar facão, machado, taco de beisebol, motosserras e martelos. "Como todos sabem, o caminho número um para incapacitar um zumbi é destruindo sua cabeça, portanto qualquer tipo de objeto contundente que possa causar grandes traumas na cabeça seria fantástico", explica. Caso você não encontre nada na sua casa, ele recomenda que você vá nas casas vizinhas, que devem estar desocupadas (ou ocupadas por zumbis). "Depois de matar seus vizinhos (zumbis), você vai querer procurar o essencial. Não perca tempo tentando roubar dinheiro ou objetos de valor. Este não é mais o mundo onde você costumava viver - dinheiro não importa mais", aponta.
Em um cenário onde o dinheiro, a civilidade e o bom senso tradicional perdem valor, as pessoas tenderiam a perseguir impulsos antes condenáveis, como o de invadir loja ou supermercado e dar vazão à pilhagem. Mas não se levarem os guias de Aguilar a sério: "Eu não sei quantas vezes eu tenho que dizer isso, mas não vá ao Walmart. Você entende que, se você for ao Walmart para saquear, você vai dar de cara com cada idiota que achou que roubar o Walmart era uma boa ideia? Em vez de encontrar as ferramentas que você precisa, você vai encontrar-se lutando contra pessoas que estão desesperadas por suprimentos. É como fazer compras no Black Friday, só que dez vezes pior", exemplifica.
Assim como Aguilar, Jacobs também tem uma regra parecida em seu guia de sobrevivência: "Faça o que você fizer, não vá a um grande ponto de venda na esperança de viver a sua fantasia de consumo Dawn of the Dead. É onde as pessoas estúpidas vão, e as pessoas estúpidas geralmente tornam-se zumbis", completa.
Quem faz
Uma pequena investigação revela o que leva alguém a criar guias de sobrevivência. "Oi. Eu sou Traci. Este site começou como uma maneira de manter e organizar minha própria pesquisa sobre habilidades de sobrevivência a desastres", escreve a americana Traci Knoppe na descrição de seu Guia de Sobrevivência ao Apocalipse, o qual também possui versão impressa. "Se você ligar a TV, ler o jornal ou ouvir as notícias no rádio, parece que há sempre algum desastre acontecendo no mundo todo dia. Para mim, parece que eles estão acontecendo mais seguidamente. Não entro em pânico nem sou extremista, mas tenho uma família a considerar, e um pouco de preparação é inteligente". Uma das dicas mais recorrentes de Traci é a manutenção de uma mochila preparada para o pior, que contenha: tabletes purificadores de água, isqueiros, fósforos, roupas, pratos, faca, lanterna, pilhas recarregáveis (todos os tamanhos), mapa, casaco, vitaminas, aspirinas, antibióticos, sabonete, entre outros.
Liquidando a sobrevivência
Em outro extremo, alguns guias de sobrevivência não utilizam o humor de zumbis nem parecem iniciativas pessoais como a de Traci. "Sua famíla não está protegida contra um ataque terrorista, furacão, tornado ou uma inundação", anuncia, em fonte vermelha, o site "Survive Anything" ("Sobreviva a tudo", em português). "Eles sobreviverão? Se o governo cair amanhã, você poderá protegê-los e alimentá-los? Eles morrerão porque vocênão está preparado?".
Assim, como se realmente não houvesse amanhã, a página conduz o leitor através de dezenas de fatos impressionantes sobre tragédias e indica que comprar um bunker não se trata da melhor garantia para se proteger em uma catástrofe. Todas as informações - supostamente as melhores dicas para se salvar em situações caóticas - são reveladas apenas parcialmente, a fim de levar o leitor a comprar o guia, há algum tempo em promoção por US$ 49. Estão entre os tópicos: "Quanta comida guardar em casa, como trancar perfeitamente sua residência em caso de ataque terrorista e o que modificar no quarto de seus filhos para evitar danos ainda maiores em caso de furacões".
Prepare-se: fogo não adianta
De graça, resta a precaução. Para Dana Martins, autora de um manual de sobrevivência contra zumbis no blog Conversa Cult, do qual é fundadora, o mais importante é planejar um plano de ação. "Já cansei de ver gente falando que mataria zumbi tacando fogo", ironiza. E foi pensando nisso que ela criou o guia - para dar dicas úteis em vez de "você precisa saber correr", como ela mesmo relata em seu texto.
Uma dificuldade encontrada por Dana, no Brasil, é a falta de acesso a kits de emergência, que são comuns nos EUA e em outros países. Por isso, ela dá uma dica: "Anote o endereço das lojas mais próximas na sua rota de fuga, porque é claro que você já tem uma rota de fuga, né? O nome disso é preparação, principal base para sobreviver em qualquer tipo de apocalipse", enfatiza.
Autossuficiência
Quem também compartilha dessa regra é o pessoal do Esquadrão Zumbi, que se dedica a orientar na preparação para desastres. "A chave para sobreviver a qualquer desastre é educar-se e ter um plano", reforça Nickels. O grupo originou-se de uma discussão após um filme, sobre como eles sobreviveriam melhor do que os personagens da história. Desde então, o esquadrão amealhou mais de 5 mil membros de carteirinha e 50 mil membros online espalhados pelo mundo. "O tema sobrevivência zumbi fornece um contexto divertido para aprender habilidades básicas de sobrevivência, sem os estigmas ligados a quem é chamado de 'survivalist' (termo utilizado para descrever pessoas que dedicam sua vida a planejar a sobrevivência na hora do apocalipse)", informa.
As dicas do Esquadrão Zumbi têm, como objetivo, tornar as pessoas autossuficientes em caso de desastre. "Quanto menos pessoas tivermos lá fora, correndo ao redor, tentando reunir suprimentos no último minuto e aumentando o caos, melhor para todos nós. Queremos que as pessoas aprendam a cuidar de sua própria comunidade e delas mesmas, em vez de esperar que alguém venha salvá-las", aponta. Algumas dicas de sobrevivência parecem piada à primeira vista, como a utilização de um cinto personalizado, à venda na página. Mas, sob o prisma caótico do fim dos tempos, talvez tenha sentido: "(Em um apocalipse zumbi) Você vai perder algum peso. Provavelmente muito. E você vai ter um tempo difícil correndo de zumbis com as calças caindo em torno de seus tornozelos", alegam.
Depois do fim
Caso alguém sobreviva aos zumbis, ao tsunami ou à colisão do asteroide, há sites que vão além do apocalipse. Doom Survival Guide ("Guia de sobrevivência em meio à destruição") se descreve como um manual de sobrevivência em um mundo pós-apocalíptico. A página se apresenta imediatamente como fonte de informações para quem aceita que o planeta acabará, mas não tenta adivinhar como isso vai acontecer. "Se você está aqui, é porque provavelmente tem suas próprias ideias", diz. Entre as possibilidades ventiladas, encontram-se mudança climática, guerra mundial, asteroides, colapso econômico e tsunami galáctico ("seja lá o que for isso"). Para se precaver, o leitor pode fazer o download do guia e imprimi-lo. A leitura abrange o uso medicinal de plantas, dicas para a criação de coelhos, o melhor tratamento para lesões nos joelhos, técnicas de fuga em caso de perseguição e maneiras de construir um abrigo. Ficou em dúvida de como planejar um jardim pós-apocalíptico? Entre no chat que o site disponibiliza.
O fim
Mesmo entre os autores dos guias de sobrevivência, não há consenso sobre as causas do fim do mundo. "Pessoalmente, eu não acredito que o mundo vai acabar em 21 de dezembro de 2012", avisa Aguilar. "Nós tivemos esses mesmos sustos antes. As pessoas adoram criar uma história a partir do nada e criar medo na comunidade". Da mesma forma, Jacobs também não crê nas teorias relacionadas ao calendário maia. No entanto, se tivesse que dar um palpite, ele acredita que uma pandemia global de algum tipo de supergripe, como H1N1 ou alguma mutação do vírus, seria a mais provável.
Independentemente do cenário, Nickels diz que o Esquadrão Zumbi está preparado. "O apocalipse zumbi é o pior cenário quando se olha para outros possíveis desastres. Queremos que o público esteja pronto para qualquer coisa, de um desastre natural, como um furacão ou terremoto, a um apocalipse zumbi", finaliza. E, no caso do horror global desencadeado pelos mortos-vivos, vale sempre lembrar de uma das regras propostas por Aguilar: "Mirar na cabeça, sempre ter cuidado, dormir com um olho aberto e não confiar em ninguém".